Nada tem que ser como eu tinha pensado.
Os frutos caem da árvore sem chegarem a perguntar porquê.
Circulam os afectos da mesma forma que a água pelos canais.
E nas sombras mais obscuras não se escondem monstros nem gemidos.
Aquilo que conta quando se fazem as contas sem fazer de conta, é o que se sente quando se sente.
Sobre o abismo que se avista do topo da montanha paira sempre a tonalidade húmida de um certo infinito.
O relativo abandono gera no coração uma vaga sensação de perda.
Como se nos confins onde custa a chegar fosse necessário um ar rarefeito.
Cada momento de azul que amanhece sobre o horizonte é uma dose suplementar de incerteza.
Vê-se, ao mesmo tempo que se ouve a monotonia dos passos a trilhar a areia, o rasto sistemático da repetição e a atracção sublime do espaço.
Não saber acaba por ser o destino mais natural.
Oculta sobre a névoa está a ambição e a prática corrente de comparar os sonhos.
Todos concorrem para afastar o pensamento do seu caminho.
Nem sempre chego ao topo com a mesma ansiedade.
Dias há que parecem claros e luminosos.
Aí, os sons são mais soltos e as verdades menos necessárias.
Cumprem-se os rituais e retoma-se o canto na dobra mais simples do mapa.
Um dia, quando, por acaso, se reunirem as condições especiais, vou pensar em todas as consequências de subir e descer esta montanha, sem que nada de sagrado me obrigue, a não ser esta genética que ocasionalmente conformou as moléculas emprestadas ao meu corpo.