A gravidade atrai os corpos
Terça-feira, 6 de Março de 2007
Importância

Há, nos gestos do dia a dia, um apelo muito forte ao esquecimento.

Enquanto se sobe a intransigente montanha, os pensamentos revesam-se até já não terem sentido.

O esforço de levar outra vez o pé para a frente do outro, esgota a sensibilidade e o entendimento.

É difícil que no topo ainda haja energia para fruir a paisagem.

Nada é comum quando os músculos se retesam para um último balanço.


Se eu tivesse um deus a que não chamasse acaso, di-lo-ia uma combinatória.

O meu olimpo tem uma fauna própria que não me aquieta.

Diverte-se a mitificar o número e a diversificar os caminhos.

Mesmo assim, o tédio é o patrono mais poderoso.

Acima do correr das nuvens já não mora a ameaça ou a salvação mas o vazio.


Nenhum acto é tão autêntico como o trabalho.

Quando queremos ser sérios e profundos dizemos que trabalhamos.

E é nesse gesto mágico e económico que se suportam os nossos sonhos.

A labuta como método de render homenagem à existência.

Culto do que não é oculto nem ficcional.


Nenhum passo é tão autêntico como o que não se deu ainda.

A energia potencial cresce enquanto as expectativas sobem aos lugares mais altos.

Há muito de irremediável na convivência com a solidão.

Diz-se a palavra e ela não chega a lugar audível.

Nem regressa.

Os sons atravessam o tempo como neutrinos.


Cada pensamento que se forma na escalada perde-se a seguir agarrado à gota de suor.

As melhores das intenções formam-se em nuvens de chuva ácida.

Neste olimpo não há nenhum deus a quem pedir clemência.

Não há também vontade de pedir, porque os que podem dar é porque roubaram.

O desequilíbrio equilibra os sentimentos.


Não fora a certeza de o poder poder não ser outra coisa que o acaso, e o ódio seria o atalho certo para a existência.

Não é aqui nesta montanha, mas é noutras em que se faz da vontade escravatura.

Lá em cima a vista é bonita.

Há muita beleza para escutar e sentir.

Mas antes disso há sempre um medo de perder qualquer coisa importante que não se sabe o que é...


Sísifo


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publicado por prólogo às 14:51
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