A gravidade atrai os corpos
Segunda-feira, 2 de Maio de 2005
Dormente
Tinha prometido não voltar sem saber tudo de mim.
Sabia, ainda que com reservas, que, do lado de lá da procura, haveria de encontrar o local do regresso.
Sabia, ainda que vagamente, que, nas histórias, o que acontece é relativamente simples.
Sabia, ainda que desolado, que, ao fechar os olhos, já estou a ver outra superfície.
O que eu sabia antes era pouco, portanto.
E foi com esse pouco que sabia que ousei prometer.
No estilhaçar dos dias há sempre correntes de nuvens que anunciam luz para o dia seguinte.
Como se, para olhar com intensidade para as coisas mortas, fosse necessário o telescópio da tristeza.
Há muitos anos, Galileu, nas suas insónias, procurava em tudo o significado de qualquer coisa.
Mas ele ainda não sabia.
Estava apenas a viver um sonho que tinha que ter um fim qualquer, mesmo que fosse disfarçado de princípio.
Mas Galileu ainda não sabia que estava a olhar para um lugar sem saída...
De onde vem afinal essa vontade de ver outra coisa que não o que está à frente da íris?
De que lugar emana essa vontade absurda de ter vontades absurdas?
De que destino se pode agora prever mais do que a sua simples substituição por outro?
De que estrada acabará por sair o infame assassino de todas as ilusões?
Tinha prometido não voltar sem saber.
Agora, neste preciso instante em que percebo melhor que não sei, procuro apenas uma folha tranquila que, caída da árvore, já tenha adormecido a sua liberdade.
Como no tal sonho em que me desencontrei de Deus e fiquei para sempre a sobrevoar frases perdidas.
amm